terça-feira, 10 de junho de 2008

O espelho. O nevoeiro.



Vejo os contornos do meu reflexo na superfície enevoada do espelho. À minha volta estende-se um nevoeiro de emoções insensíveis que em nada afectam o meu estado de espírito. Olho para a tela pronta a ser usada, pronta a ser palco do que me vier à alma no momento, pronta a ser riscada pelos traços do meu ser. Nela, imagino uma imensa paisagem , montanhas e rios, vilas e aldeias,... Vejo uma imensidão de árvores verdes, vejo uma infinidade de possibilidades. E por detrás de tudo isso, ao mesmo tempo, vejo-me a mim, o meu reflexo enevoado, aquela que todos conhecem, mas que nenhum sabe interpretar.
Então, numa fúria crescente, começo o desenho, a frase, o comentário ou apenas a meia dúzia de riscos que destroem a minha silhueta, revelando ao mesmo tempo um pouco mais de mim.
Mas no fim arrependo-me. Para que mostro o meu reflexo, se nem a minha sombra querem ver? Então apago tudo. Passo as mãos pelo espelho, e apenas me tenho a mim, o meu reflexo, olhando para mim e perguntando porque desfiz os sonhos, se será realmente apenas porque eram inatingíveis, ou se algo mais...



Agradecimentos especiais ao meu amigo PONTO por me ter sugerido o tema zD

Viver a vida é ver sem olhar,
É sentir sem tocar,
É saborear sem provar.

É ter tudo e muitas vezes
Não saber o que se tem;
É ser ingrato quando se está bem
E querer mais do que se pode
alguma vez ter.

Viver a vida é nunca estar satisfeito.
É ouvir a mesma música vezes sem conta,
Até a saber de cor ou até adormecer
Com os acordes a soarem no nosso interior.

É não acordar apenas por causa do despertador,
Mas porque se sabe que cada dia vai ser bom,
Não importa se se é sonhador
Ou apenas um tolo crente.

Como se descreve a vida?
Como se descreve o cair de flocos de neve,
ou o dançar das folhas outonais que o vento arranca das árvores?
Como se descreve um pôr-do-sol,
ou uma simples brincadeira de amigos?
Como se descrevem sentimentos e emoções?

Como nos descrevemos a nós próprios, por dentro?

sábado, 7 de junho de 2008

O poço


Corro numa imensa escadaria em caracol. Para onde me leva ela? Não sei. Não quero saber, não quero sofrer com a resposta. Mas corro sempre. Porque sei que um dia chegarei ao topo, não interessa o que aconteça pelo meio. Não interessa quantas vezes caia, quantas vezes abrande o passo, desde que continue sempre em frente. Desde que continue sempre a caminhar pela casca daquele gigante caracol. Sempre, sempre caminhando em círculos, parecendo que não me movo e que volto sempre ao ponto de partida. Mas no entanto sei que depois de cada volta estou um pouco mais perto do topo, um pouco mais perto do fim.
Finalmente, vejo a luz no cimo daquele poço vazio de iluminação. Estou quase lá, falta pouco. Os meus passos aumentam o ritmo, sinto o meu coração a explodir dentro do peito, todo o corpo a ressentir-se com o esforço. Mas continuo. Já não sinto as pernas, não sinto os pés. Ando porque o meu corpo está programado para o fazer. Já não controlo os meus movimentos.
Era agora. Faltavam apenas duas escadas…
Uma … Estava quase lá.
Ia a sair…
De repente paro. Não consigo avançar. Não quero deixar tudo o resto para trás.
Tenho medo?... Se calhar. Afinal, não há mal em recear. É isso que nos torna nós mesmos.
E assim, volto para o fundo do poço, da escada em caracol. Porque não vou deixar tudo o que tenho apenas para chegar ao topo. Não quero. Não irei fazê-lo. Vou lutar, isso sim, mas para viver melhor com o que tenho, para conseguir sempre mais, mas sempre dentro do meu poço, dentro da minha vida, dentro do meu círculo, da minha casca de caracol.
Não me importa que não chegue à luz, pois aqui em baixo eu tenho outra luz: a luz dos meus amigos, a luz de tudo o que conheço e de tudo o que quero ter. E se nunca chegar ao cimo, não me importarei.
Mas no fundo sei que talvez um dia consiga sair do meu poço. Mas sei também que quando isso acontecer, não terei pressa de o fazer. Sei que aproveitarei cada momento do antes e do depois. E do durante.
Pois isso é que é viver